domingo, 25 de março de 2012

HUMANIDADE

                                                    (Depois de ouvir My Bucket Got's A Hole In It.)

A doçura daquela
Voz a tristeza daqueles
Olhos o calor da
Trompete de
Armstrong o segregado
Desmentindo o ódio.
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                      7-VI-2005


sexta-feira, 23 de março de 2012

O IMPOSTOR CAI EM SI, E SUPLICA

Agora que me trato por tu
E se desfez a pose fingida
Do sedutor   considera a
Pele na pele a boca na
Boca   as mãos por todo
O lado   permite conceder-
Nos uma fracção de ternura
Uma fracção de (e com isto
Liquido já o poema) tremura.

quarta-feira, 21 de março de 2012

FOLHA

Não a queria
Vergada ou
Quebrada antes
Folha soltando
Se e caindo
Inexorável
               m
               e
               n
               t
               e
Sobre
Si.

segunda-feira, 19 de março de 2012

RÉPLICA

Eras nesse casamento a imodéstia do vestir
Simples de todos os dias.

Divergias das fêmeas ciosas na igreja
Opulentando de transparência os vestidos
Decotes pelo peito abaixo saltos agulha
Em velado convite à cobrição.

E eras em tudo mais que elas   
Em mérito em cérebro em desejo
Ardente que uma natural reserva
Não conseguia comigo conter-se.

Quase nada era preciso
Para cairmos um no outro.

Mas não sabes ou saberás
Pois isto nunca verás    
Que não eras tu quem eu queria
Pequena árabe
(Ou israelita)
Há séculos convertida  
Retrato da que há anos me agrilhoa.

Tivéssemo-nos tido doce judia
(Ou agarena)   
E seria em outra mulher que eu julgaria estar
O original de ti réplica
Involuntária e imerecida
Na minha cabeça desaustinada.

A que tarde ou cedo lerá estes versos   
Sabendo que é dela que falo e me consome
E se consome pelo medo de se deixar amar.

13-III-2012

sexta-feira, 16 de março de 2012

ÚLTIMA HORA

Escrevo
Pois não consigo estancar
O que em mim verte 
Do belo que me fere
Do horrível que me alimenta.

4-I- / 16-III - 2012

quarta-feira, 14 de março de 2012

TRAÇOS DO CARÁCTER

Sarcástico.
Irónico...
Sardónico?
Mordástico!

25-X-2007

segunda-feira, 12 de março de 2012

SÓ EU SEI

Fechou a porta
Suavemente e
Acendeu a luz.

Só eu sei como não
Sabia o que pensava.

sexta-feira, 9 de março de 2012

RATOS E HOMENS

“But if the while I think on thee, dear friend
All losses are restor'd, and sorrows end.”

Shakespeare


No bosque proibido   romance de mircea eliade   stefan refugiou-se do blitz londrino nas estações do metro.   No bolso levava sempre uma edição dos sonetos de shakespeare   que lia obstinadamente enquanto as bombas caíam.   Os sonnets preservavam-no da ameaça lançada dos céus.   Nessa espécie de esgoto  a poesia fazia a diferença entre ratos e homens.

quarta-feira, 7 de março de 2012

PARA A AVÓ ZÉ

Lembro-me de como gostava de estar
Debruçado sobre a mesa da cozinha
Vendo a avó a ferver as seringas
Numa velha panela redonda de esmalte.

A mesa era grande de mármore
E ali fazia os deveres da escola
Num caderno quadriculado sujo de enganos
Da aritmética com um n.º 2 mal aparado.

Hoje a avó já não ferve as seringas
Mas desfaz os morangos
em compota
Aroma
que anuncia
Escuras tardes de outono.
Estoril, 23-VI-1985

segunda-feira, 5 de março de 2012

NADA


…Mas ele nada tinha para lhe dar
Tocar-lhe era tudo
O que queria.

Fazer com esse nada
Uma porção do tudo.

sexta-feira, 2 de março de 2012

MEMÓRIA

Nunca escrever
Lábio a lábio
Ou
Sílaba a sílaba
Nem
Rente ao que quer que seja.

Nunca falar
Das zinias
E
Das tílias
(E agora
Também do hibisco).

Fugir
Do
Levedar
E do
Lêvedo.

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

IMPERIALISMO DE BOLSO

O rei de espanha que reclama gibraltar visitou ceuta pretendida pelo rei de marrocos que ocupa o saara ocidental antiga colónia espanhola.

6-II-2007

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

HOMEM AO MAR

Ouço os sinos das igrejas
Às horas certas
No vale onde me encontro.

O vento é o meu nevoeiro
O badalar é o mugir do meu farol.

Homem das cidades marítimas
Sinto o cerco dos montes   dos penedos   da floresta.
Sei que há lobos
Javalis escondidos
Cavalos selvagens pastando solitários.

O pio nocturno da coruja
Não me deixa esquecer onde estou.

domingo, 26 de fevereiro de 2012

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

GUINCHO

O sol põe-se
Sobre o lento bater das ondas
E despede-se
Do meu corpo de areia.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

A MÁSCARA

O riso  
A mofa  
O escárnio
Para que se não repare neste pobre
Mamífero à mercê do acaso
A lisonja por seguro de vida
O desdém em fuga ao compromisso
O urro que apavora em confronto.

Ergo-me deste inferno  
Burlão
Gatuno  
Assassino se mo permitirem
Ergo-me consternado deste inferno em que vivo.

Que retrato é o meu?

20-II-2012

James Ensor, «Auto-Retrato com Máscaras», 1899
colecção particular

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

FADO

Sabiam-se condenados a nunca poderem amar-se
Como a vida a certa altura lhes exigiu.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

VERDE (CORES & NOMES)

O minho é verde   cumeadas de verde   mesmo quando se nos mostram escalavradas no gerês.

Digo minho   e penso em camilo. 

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

ETERNIDADE


É tarde
Andei à procura
Da tal eternidade
E não a encontrei.

Ainda não é tarde
Falta-me um guia
Para a eternidade
Que desconheço.

A tal eternidade que
Está em nós em
Mim em ti nos
Dois nós dois num
Instante da tal
Eternidade que
Acaba e dura
Para sempre.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

ENTRE PARÊNTESES

De gatas   e sorris  
Candura posta entre parênteses  
Para onde foste nessa hora   quando te chamei
Puta 
E investi desvairado como um cão?  

A candura entre parênteses  
                                      De gatas  
                                                 E sorriste.  

Onde ficaste nessa hora?

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

VEM

Já somos nada
Quando a morte nos persegue.
Esperamo-la   implacável
Com o anúncio dos primeiros sinais.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

ESPERA

Noite fechada trouxe-me aqui   ao alto portão de ferro   Agarro-me às grades como um escravo da luz de breu   Passo o portão e em dois passos estou na abadia que parecia distar léguas   Um cheiro fétido a suor e a burel revelam um monge que me fita silencioso   Trespassa-me uma ventania de claustro e o piso antes terroso é agora de pedra   Não consigo articular uma palavra   apenas sons abafados pelos sinos que me ensurdecem   Os olhos de dentro do capuz indicam agora um rectângulo da laje   Gravado está o meu nome o dia do meu nascimento e o desta noite.
Agosto de 2000
(com alterações)

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

ESPECTROS

Dos meus mortos não fica a memória  senão em mim e que em mim morrerá
Justiça do tempo para os que viram a vida passar?

Alguns não deixaram rasto   e toda a sua vida fez sentido.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

SUBLIME PORTA

Amolece-te a vontade
O vapor do banho turco.
A memória de há pouco   todo o querer
Já passou.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

ESCREVES...

Escreves escreves escreves escreves
Nada do que dizes rompe a superfície do papel.

Escreves escreves escreves escreves
Entre o panache a a autocomiseração
O artifício e a louvaminha
O lacrimejar e a traição
Escreves escreves escreves escreves
E tudo quanto escreves escreves escreves
Escreves tem o selo de validade para hoje
Promoção de último modelo
Gravata de saldo
Embuste de tablóide
Passatempo de televisão.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

POESIA PUTA

A poesia puta pede favor
Enfeita-se   faz efeito   quer impressionar.

É da barganha a poesia puta
Joga por influência
Rasteja por atenção.

«Vejam como é a puta
Que pariu esta poesia puta»
Gostaria ela de não dizer
Mas diz   a poesia vendida.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

EM BAGDADE, TODAS AS MANHÃS

As famílias já não precisam de despedir-se dos pais   todas as manhãs
As famílias deixaram de ter pais   todas as manhãs
As famílias perderam-se das famílias   todas as manhãs de bagdade.

20-III-2007

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

PARIS, 1927

O que há nos olhos dum auto-retrato?

A coragem de ser   em Paris   1927.

Estes olhos aguardavam de almada os olhos
O corpo   o espírito.

Não sei de sarah sem almada
A não ser a suspeita levantada pelo
Retrato que de si fez   antes de almada.

O que se ganhou?

O que se perdeu?






Sarah Affonso, Auto-Retrato, 1927
Col. particular

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

E

E de elegante
E de elaborado
E de espasmódico   de efluente   de ejaculatório   de electrizante e de electromagneto   de entusiamante e de espectaculoso
E de eia!

E de edificante   de egrégio   de emérito   de engrandecido.

E de egipciano e de eleusínico
E do espanto.

E de enobrecido   de efes-e-erres   de elanguescente   de envolvente e
       [estiloso
E de escol
E de esmerilhado e também de elemental   de escandido e de escorrente.

E de etnológico   de ebanítico, de eldorado
E de escarlate   de ele e de ella
E de ecuménico
E de espalhado
E de estuário.

E de edénico   de espiritual e de espiritoso   de enigmático   de evanescente.

E de eficaz   de estremecido e de excelente.

E de «Duke»
E de Ellington.

22-XI-2006
Ellington, «La Plus Belle Africaine»

sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

O VELHO MILITANTE VÊ O MURO RUIR

E de repente percebeu que tudo aquilo por que lutara havia deixado de ser importante para as pessoas  Perguntava-se até se alguma vez o fora  Chegara a ter a impressão de que se sorriam dele  Surdiu-lhe uma angústia enorme  O peito doía-lhe e comprimia-se  Vivera em vão e isso estava para além do que podia suportar

30-V-2006

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

DO IRRELEVANTE

As bibliotecas públicas não aguentam os nossos livros.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

GANCHINHO

Põe no cabelo um ganchinho
Destapa a orelha   deixa
Ver a curva do rosto até
Ao queixo   assim   de perfil
Fecha os olhos   inclina-te
Para trás   ligeiramente   como se
Quisesses arrancar-me um beijo   e não
Eu   em desvario   to cobiçasse.

4-I-2011

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

O ESCRIBA ADESTRADO

As palavras são como as mulheres   há que saber pegar nelas da melhor maneira.  

O que nem sempre sucede.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

CONJECTURA

O sorriso que me olha sabe
O que dele pretendo  
E em sorriso suspenso
Me deixa como se não
Soubesse o que pretende.
4-I-2011

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

DÍPTICO IRAQUIANO

1. SADDAM HUSSEIN EM CONFERÊNCIA ÍNTIMA

Diz as maiores barbaridades diante duma audiência restrita e escolhida
Fingem sorver as suas palavras   como se de ensinamentos do profeta se           
                                                                                                        [tratasse
(Ou sorvem-nas realmente   decifrando o mistério que reside em cada  
                                                                                                       [tirano)
Saddam perora   sentencia   pára de falar por segundos que parecem
                                                                                                [eternidades
Como que alheio à tragédia que ele próprio é.
                                                                                                                                                                                                         I-2003

2. EMBARQUE

(Os marines rumam ao Golfo Pérsico.
 Vejo, na televisão, um rapazinho
 de sete ou oito anos, agarrado ao pai.)

Vai   despede-te do pai
Vai matar ou morrer no
Deserto.

As lágrimas embaciam-te
Os óculos   e não percebes
Meu pequeno   porque há
Homens maus a afastá-lo
De ti.

America will prevail.

Oh yes   democracy
Como sempre.

Ainda não o sabes   mas
Já o perdeste   pequeno
Mesmo de volta
Virá com a morte
Nos olhos   a morte
Dos que têm o teu
Tamanho   pequeno.
2-VI-2003

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

GENEALOGIA (5)

Há partículas do meu sangue vindas do outro lado do estreito de
                                                                                        [tariq

Guerreiros de alfange à cinta tomaram muralhas
Desbarataram o rei rodrigo
Guerrearam-se entre si.

Sangue quente em terra quente
Useiro e vezeiro no trabalho violento do gado
Manadas conduzidas por léguas e léguas além tejo
Oeste e volta
Noites dormidas onde calhava
Ao relento e ao luar
Noites transfiguradas pela geometria fractal dos corpos celestes.

Este meu sangue da barbaria
Alento de macho cobridor sem maldade ou pudor
De fácil turvação à vertigem de uns olhos rasgados em tez morena
Sangue berbere espalhado sem ida nem volta pelas margens
                                                               [de aquém Tejo.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

DEPOIS DE LER «O APRENDIZ SECRETO» DE ANTÓNIO RAMOS ROSA

O construtor sabe que veio do nada e vai para o nada   provém do magma imemorial das origens e sente que não existe outro futuro para além da poeira cósmica resultante da decrepitude inevitável do planeta   não lhe basta o instinto vital da procriação   frui cada corpo como matéria primeva e análoga a si   e luta   incessantemente luta o construtor por uma estética do bem que acolha a beleza e a fealdade imanentes   o sémen e os excrementos que fertilizarão a massa informe resultante da nova agregação do pó   até à eclosão dum outro universo   depositário das partículas de nada do construtor.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

GENEALOGIA (4)

O medo e a transgressão
O disfarce e a submissão
Correm no meu sangue
Confinado à beira baixa.

No retrato duma trisavó
Na terra
No nome da família
Inscreve-se ao baixo o rasto milenar da judeia na cara do meu
                                                                                   [sangue.

Passei a exigir-me judeu
Vestígio da nobreza do meu sangue
Berbere celta negróide.

E há segredos de roda
Tradição familiar fantasiosa de aristocracia presuntiva
Sem um pingo da nobreza do meu sangue.

A verdade é que no meu sangue há criadas de servir
Criadas em locais remotos duma baixa beira
Terra de contrabando e crime
Terra de ninguém.

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

OBSIDIA

Houve tempo em que julguei não ter tempo para ler   a minha máxima ambição foi então a de dispor de tempo para ler   uma página por dia   uma página de boa prosa   uma pauta de sinfonia aquiliniana   um fresco dum vasto painel de paço d'arcos (joaquim)   ler ler   era só o que eu queria   na paragem da carris   podia ser   ganhei o hábito de fugir ao almoço para ler ler ler   voltado para a parede sem aturar chatos e ler a sós com o meu livro   depois deixei de saber falar   cada encontro um contratempo   uma irritação   um aborrecimento   ler ler leer.

Mas pouco para dizer   e nada para escrever.

30-X-2006

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

GENEALOGIA (3)

No meu sangue há homens do mar
Celtas de olho azul vindos em balsas
Da verde erin.

Tiveram poiso por séculos na costa norte 
Mas logo se lançaram a esse mar
Acima do árctico
E desceram a sul
À aventura e à rapina.

Celtas de olho azul
Branco o loiro da barba
Neve da terra nova.

Celtas de olho azul
Roupa colada ao visco do corpo
Calor húmido dos trópicos.

Homens e mulheres da pesca e do peixe
Da costa nova à capital do império
Onde assentaram arraiais os filhos dos arrais.

Em lisboa se fixam
Trazem despojos vivos
Dos restos d'além-mar
E com eles se misturam.

No meu sangue
Tudo isto e ainda mais.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

DÁDIVA

Levou-lhe a chávena
À boca   uma dádiva
Assim parecia.

Depois de lhe provar
O mel  outra coisa
Já não queria.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

GENEALOGIA (2)

O meu sangue correu pelo atlântico
Entre barcos negreiros de costa a costa
Companhias de navegação do norte ao sul
E do sul para o norte.

Há no meu sangue alguém subtraído
Aos pais aos filhos ao amor da terra
Capturado por tribo inimiga
Prisioneiro de guerra
Ou de cilada armada.

Um negro
Robusto que bastasse para sobreviver à travessia do oceano
Grilhetas nos pulsos nos tornozelos no pescoço e na alma
Ou uma negra
Da costa dos escravos ao mercado da baía
Ou qualquer parte do brasil onde se vendesse gente como
                                                                           [mercadoria.

O meu sangue negro perde-se numa noite secular
Até um português do meu sangue branco (branco?)
Trazer uma bisavó mulata com sua mãe liberta
A bisavó que hasteava a ordem&progresso à varanda
Quando se pilhava e matava na lisboa republicana.

África américa europa américa europa
O meu sangue fez o triângulo do mar.

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

César Franck

Empolgante monotonia
Deslumbrante melancolia.


Sinfonia em Ré Menor. 3. Allegro non tropo (Otto Klemperer)

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

GENEALOGIA (1)

No meu sangue há
Comerciantes austeros de suíças brancas e longas
Relógios de cordão de ouro e ar respeitável

(Talvez o fossem)
Um ar que se permitia pendurar-se
Nas paredes de pé direito muito alto
Em casas do século dezoito.

Trataram na ribeira das naus do que chegava do brasil da índia e
                                                                               [das partes de áfrica
Alguns deixaram as mulheres e descobriram no regresso filhos
                                                                    [com treze meses de gestação
Alguns deixaram as mulheres e descobriram-se pais de outros
                                                                        [filhos em paragens distantes
Perdoai-lhes senhor
Que todos sabiam o que faziam.

Foram vizinhos do bernardo soares
Sem que o notassem
Estiveram cercados à fome pelos castelhanos em mil trezentos e
                                                                                    [oitenta e quatro
Circularam em contágio de curiosidade entre o carmo e o arsenal
                                                                                [no vinte e cinco de abril
Sem espalhafato que a sua política era o trabalho
Vaguearam doidos varridos quando o grande terramoto lhes
                                                                                    [ruiu bens e família
Sobreviveram como puderam aos exércitos de bonaparte e à
                                                                                    [tropa de beresford.

Em lisboa há séculos
Pergunto(-me) o que são e de onde vieram.

Prosperaram e caíram
O triunfo não era da sua natureza
Acertavam quando calhava para tudo se desconjuntar na geração
                                                                                      [seguinte
Cabeças no ar e mau vinho
Importação de fruta exótica e lugares na praça da figueira
Prédios no bairro alto e campo de ourique habitação ao rossio
Cruzaram-se com o eça quando ia visitar os pais chegado de paris
Mas também não deram por isso.
Já ninguém mora nas casas pombalinas e o soalho deixou de
                                                                                      [ranger.

Desde então a família circula dispersa-se e desfaz-se.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

CASTANHO (CORES & NOMES)

A beira é castanha   entre bosques e largas extensões de terra-de-ninguém.

Digo beira   e penso em aquilino.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

CÃO

Os dias passam por ele
Sem que ele dê pelo passar dos dias por ele
Adoece e não sabe que é o fim
Abana a cauda
E sucumbe
          Ao tiro no crânio
Sem espanto
          À injecção letal
Em paz.


                                                                                                                      
27-I-2003